domingo, 19 de outubro de 2008

Sobre a influência do zodíaco nos personagens shakesperianos.

Em tom de augúrio, digo que estão contidos “spoilers” elisabetianos neste escrito- caso não tenhas lido o bardo nestes últimos quatro séculos, saiba que estarão aqui manifestadas algumas cenas calamitosas. Grato.

Enervado, iracundo, com a bile em riste, Edmundo- na cena II do primeiro ato de “Rei Lear” - assevera:

“Eis a sublime estupidez do mundo; quando nossa fortuna está abalada- muitas vezes pelos excessos de nossos próprios atos- culpamos o sol, a lua e as estrelas pelos nossos desastres; como se fôssemos canalhas por necessidade, idiotas por influência celeste; escroques, ladrões e traidores por comando do zodíaco; bêbados, mentirosos e adúlteros por forçada obediência a determinações dos planetas; como se toda a perversidade que há em nós fosse pura instigação divina. É a admirável desculpa do homem devasso- responsabiliza uma estrela por sua devassidão. Meu pai se estendeu com minha mãe sob a cauda do dragão e vim ao mundo sob a ursa maior; portanto devo ser lascivo e perverso. Bah! Eu seria o que sou, mesmo que a estrela mais virginal do firmamento tivesse iluminado a minha bastardia.”

Apesar de possuir sedutora retórica, este eloquente bastardo de Gloucester nunca compreendeu todas as facetas de seu criador, o Gepeto de Stratford-upon-Avon.
É sabido que Willie- apesar de prestar culto aos ensaios de Montaigne- se amarrava num sortilégio (vide “A Tempestade”), curtia uma
bruxariazinha (vide “Macbeth”), travava conhecimento com fadas e elfos (vide “Sonhos de Uma Noite de Verão”) e (Ahá!) consultava o disk astral João Bidu para parir seus personagens (vide o desenrolar deste portentoso escrito).

Inauguremos o raciocínio trespassando a tragédia de Otelo, o Dom Casmurro de Veneza.
Desdêmona- nobre e bela patrícia- deixou a casa paterna, o conforto da internet sem fio, e da nutella com bisnaguinha, para viver aventuras mour
as mil ao lado de seu grande Otelo. Apesar da vida cigana, seu olhar nunca veio a ser oblíquo e dissimulado- ao contrário do que apregoavam todas as bravatas disparadas por Iago. Ainda assim, este temerário general achou ser de bom feitio asfixiar seu amor.
Imagine só, caro leitor, e toda essa desgraça po
r causa de um lenço! E se um futuro nascituro viesse com a expressão de Escobar, digo, de Cássio em seu frontispício? Qual a extensão da sova que Desdêmona iria tomar? Obviamente os mais argutos já depreenderam tudo: Otelo era um nativo de escorpião!!!

Você tem uma grande necessidade de participação emocional, o que lhe proporciona relacionamentos amorosos intensos e forte adesão à pessoa amada. Bastante possessivo, muitas vezes torna-se áspero e rude (jura?) ao perceber "segundas intenções" nas atitudes das pessoas, especialmente quando esses gestos são dirigidos a alguém a quem ama (ah, tá). Ao se comprometer com algo, ou com alguém, você o faz verdadeiramente de coração e de forma devotada, porém está sempre esperando lealdade e veracidade como retorno, caso contrário, aborrece-se muito. Obs: no caso de generais mouros este “muito” deve ser substituído por “bastante mesmo”.

E o que dizer de Shylock? Este usurário- que serve de antípoda ao mercador desta outra peça situada na cidade das gôndolas- é um materialista sem salvação, um homem de marketing sem alma, um yuppie avarento, enfim, um ignobilzinho empedernido. Não sobrepujando saudavelmente a fase anal (segundo nos informa doutor Sigismundo), tornou-se tão teso que fez sua única filha fugir de casa; cansada que estava de sua sovinice e de seu catecismo roosevelteano. Ao saber que ela ainda vivia, mas que gastara oitenta ducados numa só noite, Shylock só pôde concluir: “Nunca mais verei meu ouro novamente!!”. Espreitamos aqui o caso de um nativo de Capricórnio.

Sério, disciplinado e ambicioso, você considera seu trabalho, sua posição social e suas contribuições para sociedade como algo muito importante. Com muita freqüência sacrifica seus relacionamentos pessoais em função de seus interesses (não, não negue agora, sua filha acaba de pular a janela).
Dispõe de habilidade natural e astúcia para lidar com os negócios. Emocionalmente é autoritário, sem suscitar misericórdia. Seus principais defeitos são justamente sua tendência para ser rígido, inflexível e demasiadamente sério. Obs: ao chegar ao inferno, encaminhe-se diretamente à quarta esfera, em caso de dúvida, procurar o demônio Plutão.

Finalmente, apontemos nossos juízos para Hamlet, o procrastinador da Dinamarca.
O meninote Hamlet sempre foi um buliçoso, um
amante da arte, da filosofia e de toda manifestação do belo, até que papai Homônimo foi encaçapado- indo morar na cidade dos pés juntos. Oh conspurcação! A vida tornou-se comer insosso e beber salgado. Muitas notas baixas em Wittenberg, muito ansiolítico em Elsinor. Até que em determinado momento da cena IV do primeiro ato- e que momento foi aquele!- o defunto genitor revela: “Filho, seu titio ceifou minha vida, passa a foice nele por mim”. Hamlet, intrépido e resoluto, deixa passar em branco todo o segundo ato e lá pelo final do terceiro ainda tem a pachorra de proferir o avelhentado monólogo (sem o crânio na mão, que fique claro): “Should I stay or should I go?”. Ao que se sucederá não só ao falecido, mas a qualquer infeliz que tenha sangue trafegando em suas veias: “ESTA INDECISIÓN ME MOLESTA!!!”.
Pra encurtar o palavreado: ele mata por engano Polônio, pai de Ofélia (que é princesinha de seu coração) é convidado a se retirar do reino em que algo está a apodrecer, é sequestrado por piratas, Ofélia endoidece e morre afogada, ele volt
a pra Dinamarca, monologa mais um pouco sobre vida e morte (agora sim, cá está o crânio), vê o enterro de sua amada e ainda logra delongar até desfechar a estocada final na panturra de Cláudio. Foi preciso estar às portas do grande mistério, sob a égide da desgraça, no bico do corvo, próximo ao fim de tudo (do quinto ato e da peça, inclusive), para o príncipe das abstrações agir. Eis Hamlet, o libriano típico.

Você é de natureza mental. Gosta de florescer, fazer arte e equilibrar, daí seu símbolo ser a balança, que procura harmonizar até os elementos mais diversos. Para fazer isso, é preciso julgar e avaliar, mas você teme o julgamento e hesita (e como), pois precisa ser equilibrado e tem medo de se enganar. Estar de bem com os outros e ser complacente com eles, é algo muito importante para você, que prefere mais realizar tarefas junto de alguém a fazê-las sozinho (alguém aí quer me ajudar a matar meu tio?).

O resto, regularmente, é silêncio.

* Depois de usado o estímulo correto ("se você falar, vamos todos JUNTOS à uma sorveteria"), o autor do texto acabou admitindo que é libriano.

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