Da vez em que tirei Hermeto Pascoal no amigo secreto.

Quão grande foi minha alegria ao desdobrar o papelzinho e encontrar aquele nome; Hermeto. Não era nome de menina, não teria que comprar uma daquelas agendas do Mickey- marca nacional com nome estrangeiro, vinham numa embalagem de papelão em formato de pedaço de queijo. Não se podia mais perder tempo com bonecas, o termo teen já percorria a classe média joseense e as meninas precisavam ter seus onze anos agendados.

Desce o dedo; Fernando, Guilherme... Hermeto Pascoal: um acordeão 120 baixos, um bombardino ou um pífaro.

Mas pra quê ele quer justo um 120, que é o mais caro? O de 80 é bom também e é leve. Não. Compre o pífaro pro Hermeto. Se ele quiser um 120 baixos que pegue emprestado com o Sivuca- sentenciou meu pai.

Ainda estranhava o fato de tê-lo tirado. Não lembrava dele na sala de aula, nem na escola. Me falaram que ele tinha uns 57, era velho demais pra estar na quinta série. E também não sabia que morava em São José, pelo menos não na dos Campos; talvez na São José Egito dos poetas e de meus pais. Depois soube que vivia numa canoa na lagoa em Alagoas.

Enrrolado o pífaro em papel colorido, selinho da loja lacrando o embrulho. As cadeiras em círculo, todos com o presente em mãos; queijos de papelão em sua maioria. A porta abre, entra com cabelo bem comprido, todo branco. Camisa colorida, sandália de couro. Começa com os mais velhos; ganho abraço e disco de Luperce Miranda que escuto até hoje quando estou triste. Dou o pífaro, ele dá sorriso. Karina, por ser a segunda mais velha, recomeça a brincadeira.