segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Coltrane; supremo.

Livro detalha como foi a gravação de A Love Supreme, suíte considerada uma das obras-primas da história do jazz

“No momento apropriado, com todos a postos – e com uma noite inteira de gravação pela frente –, Coltrane apontou para Van Gelder por trás do vidro da sala de controle. O gravador de rolo começou a rodar.”

Na noite de nove de dezembro de 1964, John Coltrane gravava o que viria a ser um de seus álbuns mais conhecidos e celebrados; criava também uma das peças fundamentais da história do jazz, a suíte dividida em quatro partes, “A Love Supreme”.

Como Miles Davis, Bob Dylan e outros grandes músicos do século passado, ele buscava uma constante evolução de sua técnica e sonoridade. Rompendo com os cânones e criando uma identidade ímpar, eles tiveram uma trajetória permeada por várias facetas musicais; nem sempre compreendidas e aceitas por seus contemporâneos.

Depois de tocar na big band de Dizzy Gillespie, de trabalhar com Johnny Hodges, de fazer parte do famoso quinteto de Miles Davis e de ser “apadrinhado” por Thelonious Monk, Coltrane finalmente consagrou-se como band-leader, solista e compositor em 1957 com o álbum “Giant Steps”. Mas, de acordo com sua própria avaliação, o disco também parecia um fim da linha criativa.

“A Love Supreme” encontra o saxofonista no ápice de sua expressão espiritual por meio da música. Curtis Fuller, trombonista que convivia com Coltrane na época, afirma recordar-se do músico lendo o Bhagavad Gita, o Torá ou a autobiografia do guru Yogananda. No texto de contracapa do álbum, Coltrane afirma:

“Durante o ano de 1957, experimentei, pela graça de Deus, um despertar espiritual que me levaria a uma vida mais rica, mais plena, mais produtiva. Naquele momento de gratidão, eu humildemente pedi que me fossem dados os meios e o privilégio de fazer os outros felizes por meio da música.”

O interesse do músico pelo divino somado à empatia que existia entre o lendário quarteto (o pianista McCoy Tyner, o baixista Jimmy Garrison e o baterista Elvin Jones o acompanhavam há mais de três anos) resultou em uma manifestação artística vigorosamente duradoura e influente. Vários músicos, entre eles o guitarrista Carlos Santana, se declaram fiéis ao álbum. O fascínio e o mito em torno do músico após o lançamento do disco tiveram como fruto, entre muitos outros, a fundação da Igreja Africana Ortodoxa de São John Coltrane em São Francisco na Califórnia.

A Love Supreme – A Criação do Álbum Clássico de John Coltrane, escrito por Ashley Kahn (Editora Barracuda) aborda com riqueza de detalhes a realização deste antológico trabalho. Além de contextualizar historicamente a obra, também retrata a vida e carreira de Coltrane.Kahn também é autor de Kind Of Blue – A História da Obra-Prima de Miles Davis.

*[publicada na revista Brasileiros 7; fevereiro de 2008]

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