Tragou, soltou uma baforada com cara de vadia e entrou na Lan House.
Seguiria apenas a rotina e-mail, orkut, chat? "É um tabaréu” - pensou ela - "não sabe nada sobre chegadas e saídas, embarques e desembarques". Será que já depositara o dinheiro? Apertou o botão de novo, nenhuma atualização. Na terceira vez em que se viram, ele a flagrou de toalha enrolada no cabelo e de coxas bem torneadas à mostra. Quanto tempo já fazia?
Pagou pelos inúteis 15 minutos de internet - salvo a conferida no orkut - e saiu. Nem dois passos, "preciso fumar". A mão cega procura pelo maço perdido na grande bolsa de couro sintético (comprada em oito vezes na C&A, última prestação a pagar) enquanto caminha apressada. Um sorriso torpe nasce no primeiro contato com a superfície plástica da caixinha. Ela pára. Santo o cigarro que a salvaria naquela noite. Mas na briga cigarro/isqueiro/grande bolsa o herói se perde e cai na calçada. Abaixada, analisa o resgate: "Acho que dá.". Os olhos então encontram alguém que buscava cama sob a marquise. Seria desprezo naquele olhar? Envergonhada, desiste e segue caminho. O árbitro do seu desespero agradece, teria abrigo além do chão e cobertor.
“Ai, Miguel por que você faz isso comigo?” -o instante com o desvalido já amortecido em sua mente- “Porque precisa ser tudo tão intricado?”.
As ruas pássaros se sucedem; Cotovia, Gaivota, Canário- antes que chegue a pomba, entra num táxi. Sem rumo, a destinação é a casa. Três lances de escada, chaveiro do sucrilhos, zíper aberto, porta do quarto.
Nada. Tudo igual: a cama com o lençol branco esticado a perfeição, o guarda-roupa de pequenas portas, a cadeira vazia. Aquela prudência ambiente não cabia às roupas que ia largando pelo quarto. Na cama, a grande bolsa, conteúdo espalhado; no chão, a blusa de estampa duvidosa (Onça? Zebra?). Justíssima, a calça (promoção na Marisa, pagamento à vista) diminuiu o ritmo irritado com que se despia, exigia certa técnica para sair. "Droga!" A praga trazia mais de um destino. Servia à calça, a Miguel, àquela droga de quarto vazio... Precisava de um cigarro.
*Conto sobre os personagens de uma madrugada paulistana. Escrito a quatro mãos -mais as duas dela do que as minhas duas- com Natália Bridi.
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